O movimento sindical foi responsável não apenas pela melhoria
na qualidade de vida dos trabalhadores do país, mas contribuiu também
para o processo de redemocratização. Quem diz que sindicato é coisa
inútil, por exemplo, deveria aceitar o índice de reajuste oferecido pelo
patrão e não aquele que foi negociado pelo sindicato de sua categoria.
Claro que também possuem defeitos, com gente corrupta e imprestável,
como todo ator social que detém poder e influência, como partidos
políticos, igrejas e a imprensa.
Há sindicatos que fazem, inclusive, um necessário contraponto ao
desenvolvimento a todo o custo e ao progresso cego. Muitos, mas nem
todos.
É interessante ver o que está acontecendo em grandes obras espalhadas
pelo país. Durante a última greve nas obras da usina hidrelétrica de
Jirau, em uma assembléia que discutia a continuidade da paralisação na
semana passada, sindicalistas foram vaiados por trabalhadores, que
atiraram objetos contra o carro de som. Já em Altamira, onde desde
quarta passada parte dos operários das obras da usina de Belo Monte
cruzaram os braços, sindicalistas distribuíram panfletos dizendo que a
greve é ilegal e que estaria sendo promovida por elementos interessados
em acabar com os empregos gerados pela obra.
Fascinante. Trabalhador é trabalhador, patrão é patrão. No meio dos
dois, o diálogo e, quando este não surte efeitos, pode-se adotar a
paralisação e a greve, que são instrumentos democráticos de
reivindicação. Parar de gerar valor para o empregador enquanto este não
resolver negociar decentemente é um direito. O Consórcio Construtor Belo
Monte, responsável pelas obras, distribuiu folhetos em que insta os
trabalhadores reivindicarem enquanto trabalham. Ou seja, protestarem por
melhores condições, mas sem pressão, por favor.
Eles podem solicitar isso. Desde o fim da Gloriosa – que inaugurou a
era das grandes obras, que consomem moradores e operários – temos a
liberdade de dizer o que quisermos. E, em praça pública, fazer o devido
enfrentamento. Curioso, portanto, que a própria empresa esteja, através
de um pedido na Justiça, tentando impedir um jornalista ligado a um
movimento social de cobrir a greve. Ou seja, o direito à liberdade de
expressão existe, mas segue seletivo.
O governo brasileiro inundou o país com bilhões em recursos para a
construção, com o objetivo de modernizar a infra-estrutura e erguer
moradias, girando a economia. Só que “esqueceu” de uma coisa: com o
mercado imobiliário aquecido, a busca por áreas urbanas para a
incorporação levaria à expulsão de comunidades pobres que disputam a
posse de terrenos. Se a Justiça considerasse sempre a função social da
propriedade para tomar suas decisões, como está previsto na Constituição
Federal, a história seria diferente e essas comunidades teriam direitos
preservados. Mas se o Coelhinho existisse, talvez eu tivesse ganho o
ovo de chocolate que tanto queria na última Páscoa. Ou se Papai Noel
fosse de carne e osso, obras para a Copa não desalojariam ninguém de
forma questionável.
A situação trabalhista na construção civil é grave – os protestos na
usina hidrelétrica de Jirau, que levaram a um quebra-quebra no ano
passado, foram a cereja do bolo. Pipocam manifestações de trabalhadores
nas obras de estádios para a Copa do Mundo e casos de trabalho escravo
(artigo 149 do Código Penal) em obras de moradia. Até em empreendimentos
pertencentes ao “Minha Casa, Minha Vida” o Ministério do Trabalho e
Emprego já libertou gente. O governo federal lançou, no mês passado, um
acordo com o setor da construção civil para resolver os problemas e
elevar a qualidade de vida dos operários que, até agora, não surtiu
grandes efeitos.O Planalto não se planejou para esses impactos da
transformação do país em canteiro de obras. Para falar a verdade, não
planejou muita coisa nessa área.
O governo defender uma visão de desenvolvimento que privilegia o
crescimento do bolo em detrimento à sua divisão, é compreensível. É
triste, mas entende-se devido à quantidade de interesses que ele acaba
atendendo. Quando isso ocorre com representantes de trabalhadores, a
situação é diferente.
Sei que hoje somos modernos, ou melhor, quase pós-modernos. E que o
Brasil é o país do deixa-disso. Mas vendo que alguns representantes dos
trabalhadores não estão conseguindo se entender com seus representados,
me pergunto por quanto tempo eles serão considerados úteis.
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