terça-feira, 23 de julho de 2013

Contra o que estamos protestando?

Desconfio que vai levar ainda algum tempo até que especialistas em comportamento humano possam decifrar as razões das manifestações chamadas até agora de "dos estudantes" ou " da juventude", havidas no mês de junho no Brasil.

Quanto a mim que não tenho compromissos com carreira, diplomas ou currículo profissional fico a vontade para dar uns pitacos sobre o que pode ser esse tal de "grito da rua" que é o outro nome dado ao dito movimento pois mesmo que eu erre, e isso é quase certo, não serei responsabilizado e nem cobrado por dizer verdades que não correspondam aos fatos.

Começando desde o tempo em que o Homem dava seus primeiros passo na Terra sabe-se que já naquela época os seres humanos sentiam a necessidade de agruparem-se, agindo desde aquele tempo um tanto de acordo com o ditado que surgiria muito mais tarde que nos ensina que nenhum homem é uma ilha. Nossos distantes antepassados passaram a viver agrupados naquilo que chamavam de tribos. Que evoluiu para vila - acho eu - depois cidades, reinos e outros agrupamentos que eu não me atrevo a citar sem ferir a cronologia da Historia. E como há uma distancia enorme entre aqueles tempos e esse nosso, melhor eu pular logo os milênios que nos separam daqueles ancestrais e olhar para os tempos mais recentes, sobre os quais é mais fácil falar e compreender.

Então estávamos nós, os humanos, já divididos em vilas, cidades, estados, países, continentes e esta divisão dava-se de maneira natural e sem qualquer interferência, ou seja, pertencíamos ao grupo de onde nascêssemos, geograficamente digo eu. Mas dada a tendência humana de enfadar-se com tudo, deve ter havido um momento que nossos antepassados resolveram que as divisões de grupos humanos poderiam ser muitas mais, embora eu ache que já nesse tempo viviam-se  as divisões por classes econômicas e religiosas.

Mesmo sem ter ciência disso, os tataravós de nossos tataravós seguiam a risca mais um ditado, além daquele já citado que diz que  nenhum homem é uma ilha, um outro que diz que a união faz a força. E passaram a dizer entre si que seria muito bom que as pessoas com qualquer tipo de interesse se reunissem com as outras com o mesmo interesse a fim de apoiarem-se uns nos outros na busca de, em primeiro lugar, entenderem por que se interessavam por aquilo, e em segundo diferenciar-se das demais pessoas que não se interessavam pelo que lhes interessava. Estava-se construindo uma bobagem muito maior do que pode parecer, a primeira vista, esta minha narrativa na busca de entender o que aconteceu em junho nas ruas do Brasil. 

E olhando tudo aqui do alto deste ano de dois mil e treze do século vinte e um, como se atrás de nós tudo pudesse ser visto com um gráfico, ou uma linha do tempo para estar mais de acordo com esses tempos de redes sociais, devem casar-se perfeitamente o momento em que surgiram os profissionais padeiros e sua associação, depois os ferreiros e seu sindicato, muito mais tarde surgiriam os engenheiros com seus conselhos, os políticos e seus partidos, os mutuários do BNH e suas entidades, os praticantes de surf e suas federações, enfim tudo em que houver a possibilidade de  reunirem-se dois ou mais indivíduos com os mesmos interesses aí existirá também um representação destes mesmo interesses.Tudo sempre subentendido pelos participantes dessas agremiações que a união faz a força. União aqui entenda-se a reunião das pessoas com os mesmos interesses, e  fazer a força pode querer dizer defender estes interesses, não se sabe bem contra quem ou contra o que.

E deu-se que nós homens nos vimos de repente tão fatiados e representados em qualquer coisa que façamos - profissão, religião, lazer, sociedade, família, negócios - que ao mesmo tempo que nos agregamos e por mais paradoxal que possa parecer nos sentimos também separados de outros grupos que, por razões diversas, não fazemos parte.

E junto a essa tal defesa de interesses contra quem ou contra o que não se sabe o homem meteu-se numa enrascada pois claro está que ao defender ferrenhamente seus interesses  impediu não só a si mas a todos os outros, o experimento de novas possibilidades para as mesmas coisas.

Parece que chegamos ao ponto em que os fabricantes de tampinhas de garrafa não podem evoluir no modo de fazer, apresentar e fechar as garrafas, sem ouvir protestos e tentativas de impedimentos da associação dos fabricantes de abridores de garrafas, que julgam os fabricantes das tampinhas um cartel que age em interesse próprio sem olhar para o restante da sociedade, em especial seus associados fabricantes de abridores de garrafas, que certamente acumularão astronômicos prejuízos se forem lançadas as novas tampinhas de garrafas.

Estamos muito próximos de cada vez que tentarmos dar um passo adiante, mesmo que isso seja em beneficio da maioria das pessoas, uma minoria desde que reunida sob uma entidade com mais força que a simples união faz, impedirá o tal passo evolutivo.

Desculpem-me meus caros e raros leitores se demorei mais que o normal para chegar ao ponto do que quero lhes dizer, mas em resumo é isso: acho que nos representamos demais, nos fatiamos demais, nos unimos demais, nos defendemos demais.

Talvez seja esse o sentimento de quem foi para a rua no mês de junho: juntar-se apenas, sem necessidade de uma organização que lhes represente, sem assembleias, sem coletas de votos, sem maiorias ou minorias, apenas uma porção de seres humanos buscando falar sobre seus interesses, pois tanto nos juntamos em grupos, tantas camisetas vestimos, tantas carteirinhas e crachás portamos que ao mesmo tempo que nos dão direitos, nos massificam e nos retiram a personalidade, e nos esquecemos que somos indivíduos.

Não podemos mais viver sob os interesses de milhares de pequenos grupos cujos conflitos impedem que a coletividade como um todo usufrua daquilo que lhe é de direito, ou seja, mais igualdade, mais solidariedade, mais fraternidade. Não precisamos de milhares de associações e representações. Precisamos lembrar que podemos ser apenas uma única Irmandade de Homens.

You may say i´m a dreamer, but i´m not the only one... ( John Lennon)