Atenção, atenção: estamos nos transformando num “Estado policial” ou
“policializado”. Estado democrático, de direito, mas um Estado onde o
interesse social só tem a proteção do Ministério Público, da Polícia
Federal, da Receita Federal e dos magistrados que autorizam devassas. O
resto – Executivo, Legislativo, imprensa e sociedade civil – está
paralisado, entorpecido, inerte diante de um formidável lodaçal que se
espalha, se infiltra e se aprofunda irremediavelmente. Nenhum desses
poderes quer se comprometer, enredar-se. Todos, sem exceção, têm medo de
respingos.
A sociedade brasileira está perdendo a capacidade de se defender, sabe
apenas chamar a polícia. E depois entrega os malfeitores a um Judiciário
atravancado, aturdido, lerdo, muitas vezes venal. Se o diagnóstico está
correto estamos à beira de uma decomposição institucional.
Tudo começa numa imprensa desfibrada, burocratizada e mundana que já
não sabe qual o seu papel. A imprensa regional mimetiza aquela que se
apresenta como nacional e o resultado deste conluio de equívocos é que
não temos vigilância na esquina nem nos grandes espaços.
Vício perigoso
Carlos Augusto Ramos, vulgo Carlinhos Cachoeira, começou na esquina,
opera a sua rede de contravenções há pelo menos duas décadas num estado
rico, próximo dos grandes centros e onde existe uma mídia regional bem
implantada. A Organização Jaime Câmara, estabelecida logo em seguida à
fundação de Goiânia (1935), edita o diário O Popular, um dos melhores do país, tem um sistema de rádio e outro de TV com onze emissoras e repetidoras.
Este complexo midiático, porém, não foi capaz de perceber a intensa e
ousada movimentação do contraventor-mor, mesmo depois do seu
envolvimento com Waldomiro Diniz, assessor do então todo-poderoso
ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, no primeiro mandato do
presidente Lula da Silva.
Este observador não pretende lançar suspeições sobre o grupo midiático;
está, sim, radiografando os sintomas da inércia jornalística que hoje
domina grande parte da mídia regional brasileira. O poder da grande
imprensa americana veio de uma brava imprensa regional treinada nas
trincheiras jornalísticas locais. A interdependência dessas esferas gera
uma comunidade atenta, ágil, que só recorre à instância policial na
hora do desfecho.
Para não parecer provinciana nossa mídia regional adota um glamour
desbotado, cerca-se de colunistas sociais e veste Prada, esquecida de
que o seu pedigree ou virá da dedicação ao interesse público ou de nada valerá.
O Estado policializado, dependente do poder de polícia, incapaz de
detectar ameaças e denunciá-las, é em última análise fruto de uma
imprensa – grande, média ou pequena – viciada no perigoso jogo de olhar
para o lado.
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