Por Eduardo Guimarães no Blog da Cidadania
Há algumas semanas, conversava com um parlamentar de convicções socialistas e, lá pelas tantas, ouvi dele que o governo Dilma estaria “dando uma guinada à direita”. O dizer do parlamentar reflete uma percepção que vai se tornando cada vez mais ampla.
Há uma profunda frustração de setores da esquerda com a atuação de Dilma, em torno de quem a esquerda se uniu em 2010 de forma a barrar a eleição do político que hoje simboliza a direita brasileira em sua graduação maior de reacionarismo, José Serra.
A começar pelo comparecimento da presidente da República à festa de aniversário do jornal Folha de São Paulo no início do ano passado, sobreveio uma longa lista de medidas e gestos políticos inaceitáveis para a esquerda, inclusive para a mais moderada.
Possivelmente, portanto, vem faltando compreensão da natureza de um governo que se elegeu através de uma aliança em que o partido da presidente, apesar de ser o de maior peso, é apenas um dos componentes ideológicos.
As diferenças entre os governos Lula e Dilma começam pelos vices de cada um. José Alencar pertencia a um partido inexpressivo (PRB) e sua atuação resumiu-se a ser uma espécie de fiador de Lula junto ao capital. Michel Temer é outra história. É presidente do PMDB, o segundo maior partido do país, logo atrás do PT.
No governo Lula o PMDB era um aliado, mas não tinha o peso que tem no governo Dilma por ter elegido seu vice-presidente. Ou seja: o PMDB de Dilma é muito mais influente do que o PMDB de Lula, inclusive pela legitimidade que tem para influir.
E o que é o PMDB se não um partido de centro-direita tanto quanto o PSDB? Com esse e outros partidos conservadores na aliança que o sustenta, se excluirmos o PT esse governo tem uma base majoritariamente de direita, ou de centro-direita.
O governo Dilma, portanto, tem contas a prestar tanto à esquerda quanto à direita.É um governo que se pretende de união nacional, um governo que pretende fazer divergências ideológicas intransponíveis coabitarem sob o guarda-chuva do poder.
Não vai, aí, nenhuma crítica ao governo Dilma ou ao PT. O fato é que este partido jamais chegaria sozinho ao poder. A alternativa seria o Brasil eleger um governo muito mais à direita, sem um só partido de centro-esquerda na aliança.
Entre a militância de esquerda frustrada pelos rumos do governo Dilma, portanto, falta a compreensão de que ele deve satisfações ao seu quadrante conservador. É um governo apoiado por banqueiros, latifundiários, sindicalistas, movimentos sociais…
Não se está, aqui, fazendo apologia a essa aliança entre o capital e o trabalho que elegeu o governo Dilma, apenas se está constatando um fato: não existe traição nesse governo, mas composição entre ideologias.
O governo Dilma é uma experiência inédita na história política pós-redemocratização. Jamais houve uma aliança parecida entre esquerda e direita, mesmo que seja entre esquerdistas e direitistas moderados.
E, goste-se ou não, tanto uma quanto outra ideologia têm legitimidade idêntica para influir neste governo. O eleitor conservador não é mais nem menos do que o progressista. Pretender que o governo Dilma se paute pela visão unicamente esquerdista, é um equívoco.
Há, finalmente, uma reflexão que a esquerda precisa fazer: queimar pontes com o governo Dilma por não entender sua natureza de governo de conciliação ideológica significa jogá-lo nos braços dos conservadores que o sustentam tanto quanto os progressistas.
O governo Dilma é o que se pode conseguir em um país ainda extremamente conservador que segue dogmas religiosos com um fundamentalismo impressionante mesmo quando se constituem em verdadeiros absurdos.
Refletindo serenamente, constata-se que um governo temperado por direita e esquerda é preferível a outro totalmente de direita como seria o de José Serra ou congêneres. Como socialista, não gosto desse fato. Mas não tenho como fazê-lo sumir.
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