quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Mocinhos e bandidos

Talvez não tenha sobrado nenhum adjetivo de indignação ainda por ser dito a respeito da noticia de uma ex-policial civil que foi revistada por um grupo de também policiais civis que, dentro das instalações da Policia Civil, atentaram contra a dignidade e a honra da moça tirando-lhe as roupas com a desculpa esfarrapada do cumprimento do dever.

Esse ato soma-se às outras centenas que vemos acontecer rotineiramente, cometidos por ditas autoridades que deveriam dar exemplo de civismo, cidadania e respeito ao ser humano. Como é o caso, por exemplo, de dois policiais na semana passada na periferia de São Paulo que agrediram com muitos pontapés, cascudos e safanões um moço que pilotava uma moto e que não teria parado diante da solicitação dos policiais de que o fizesse. 

E ouvimos por aí vozes que se levantam a favor ou contra atitudes desse tipo sendo que as primeiras dizem que são necessárias atitudes rigorosas e punições exemplares em cima de quem desafia a lei e a ordem, e as segundas partem para o discurso humanitário de que todos merecem respeito, no que eu estou de pleno acordo.

Mas me surpreendo muitas vezes em perceber uma sutil variação de preferências e argumentos no meio dessas vozes. Há uma indisfarçável tendência ideológica nesse assunto que passa bem longe de uma genuína defesa da tolerância, da concórdia e da compreensão entre as pessoas. Os favoráveis às punições exemplares o são quando se trata de crimes comuns cometidos por integrantes das minorias e essas mesmas vozes são no mínimo passivas diante dos crimes menos visíveis e menos traumáticos fisicamente cometidos pelas classes, digamos assim, mais privilegiadas. E o contrário também é verdade. Aqueles de coloração dita humanitária reagem com indignação exacerbada diante de violências cometidas contra o mais fracos, mas extasiam-se em desancar, abominar, julgar, condenar e penalizar muitas vezes de maneira indecorosa, injusta e verbalmente violenta contra crimes cometidos pelas classes que chamamos de privilegiadas.

Existe um que de maniqueísmo permeando quase todas as manifestações que contenham viés de julgamento.

Peguemos o evento promovido pela Folha de São Paulo em comemoração ao seu aniversário de fundação essa semana e que teve a presença da nossa Presidente Dilma. 

Houve um pandemônio nas hostes dos eleitores de Dilma. A maioria condenou o gesto dizendo que onde já se viu, ir até a casa daqueles que até ontem levantaram calunias e difamações contra ela. Teve gente que fez questão de analisar o discurso que ela fez, dissecando-o palavra por palavra traduzindo algumas como recados dados aos seus detratores e outras como sendo sinal de submissão. Teve até o uso da expressão "tapa com luva de pelica". O que se lê nas entrelinhas desse tipo de discurso é uma espécie de decepção por Dilma não jogar duro com " essa gente", não processá-los, não derramar sangue. E que Dilma não deveria ter dado tapa com luva de pelica, mas sim de boxe.

Preocupa-me imaginar qual seria o comportamento de muitas pessoas se a elas fosse dado algum poder sobre os indivíduos tal e qual têm a policia,  os juízes e o presidente da republica.

Dilma foi corretíssima. Não em seu discurso - que de resto foi igual a todos os discursos em ocasiões como aquela -, mas em seu gesto que para mim significou a afirmação de que ela compreende a magnitude de seu cargo no sentido de que nele ela pode e deve fortalecer o diálogo, a compreensão e a tolerância.

Revanchismos, demonstrações de força, truculência, julgamentos precipitados, só pioram as coisas. Atitudes belicosas e beligerantes servem apenas para provocar a força contrária, e podem por a perder um projeto importante de construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

O policial que bate no infrator e o humilha só faz provocá-lo para que na primeira oportunidade ele faça o mesmo com o primeiro que encontrar pela frente.  Os comandantes de qualquer grupo, desde a sociedade amigos do bairro, da sindicância do prédio em que moram, até o presidente da republica devem dar exemplos de cordialidade, disposição para o diálogo e do perdão.

Um dia haveremos de aprender que existem mais força em nossas palavras gentis, abraços e perdão no que na potencia de cem bombas de mil megatons cada uma.

E tenho saudade dos tempos dos filmes de mocinho e bandido que eu assistia nas matines lá no Cine Guanabara, na paulistana e periférica Vila Formosa, filmes que, embora tivessem sempre um monótono e previsível final em que os mocinhos venciam  os bandidos era certo que eles venciam sem violência e com justiça. E junto com eles venciam também, meus melhores sentimentos.

Fiquem em paz,

Jonas


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