Dia desses tive a oportunidade de participar de um curso de poucas horas
cujo tema era segurança em condomínios, e que tinha como palestrante um
sargento da policia militar. Omito detalhes que identifiquem o curso ou o
instrutor por razões óbvias e até por que o que vou falar a seguir não diz
respeito a um individuo apenas, mas a instituição que costumamos chamar de
Segurança Publica.
E o tal sargento começou dando sua opinião sobre por que os assaltos em condomínios
aumentam a cada dia. Segundo ele por que vivemos sob governos ladrões! ( sim
senhores ele chamou todos os governos de ladrões, evidentemente esquecendo-se
que ele é representante do governo) e que por causa da roubalheira cada
vez maior na esfera publica, os empresários sonegam impostos e guardam seu
dinheiro ou os bens comprados com fruto da sonegação em casa. Vai dai que os
assaltantes (que ele condena por roubarem) invadem os aptos dos empresarios (
que ele apoia por sonegarem) tendo certeza de que seus assaltos darão bom
retorno.
Comecei a me preocupar com o que vinha pela frente em especial por que, segundo o proprio sargento, ele treina os PMs que patrulham as ruas de nossa cidade.
Carregado de preconceitos e machismo cada vez que o sargento referia-se a um
porteiro de edifício fazia-o de maneira caricatural colocando na voz e nas
palavras o tom e o vocabulário de pessoas débeis e analfabetas. Ao falar das
mulheres não economizava no "gostosas" ou então sempre se referia a
elas como dispostas a chifrarem seus maridos.
Atrasado e/ou deslocado da realidade atual falou um pouco sobre tatuagens. Ele quis mostrar aos participantes do grupo o que significam tatuagens no mundo do
crime. Segundo ele a depender da localização da tatuagem no corpo e também do
desenho, o significado de uma tatuagem vai desde "chefe de bando",
passando por "estuprador" indo até "homossexual".
Pedi licença e perguntei a ele como a PM estava lidando com o uso que já
esta certamente se tornando comum de tatuagens. Perguntei como ficam os próprios
PMs pois é possivel que entre eles o uso de tatuagem já deve ser bastante comum.
Ele não respondeu. Fez de conta que não entendeu e continuou com seu nada
esclarecedor significado das tatuagens como forma de identificar o caráter ou a história de vida das pessoas.
E assim seguiu o curso. Numa certa altura ele descreveu como são as batidas
policiais e, a respeito daquela cena que todo mundo vê na TV em que o policial
encosta um "suspeito" de frente para a parede e passa e encoxa-lo,
aquilo na sabedoria militar-policial tem o poder de intimidar o tal suspeito uma vez que este passa a sentir uns arrepios e, com medo de ser violentado ali mesmo, fica
calmo e manso.
Enfim a profundidade do seu conhecimento sobre técnicas de repressão a
criminalidade e/ou apuração de ilícitos diversos é menor que de um pires. E
isso se deu naqueles dias em que a onda de violência em S Paulo havia mais que
dobrado o que me fez imaginar que a razão daquele crescimento pode estar no fato de que a
Segurança Publica, a nossa segurança, treina pessoas com conceitos desses.
Ah esqueci-me de mais uma. O tal sargento nos ensinou também que o
Brasil é tão errado do jeito que ele acha que é errado por causa de nosso espírito
de solidariedade !! (?) Sim senhores ele resvalou por uma espécie de cultura do
egoísmo onde ele afirmou que o segundo colocado em qualquer coisa é o primeiro
colocado entre os perdedores. Segundo ele um homem não deve sequer financiar ou
ajudar a pagar a faculdade da esposa pois quando ela virar doutora vai dar um
pé na bunda dele.
Agora imaginem um soldado indo pra rua trabalhar e pensando em tudo isso.
Pensando em que pobre é apenas uma caricutura de ser humano, em como estão certos os
sonegadores de impostos, em que significa a tatuagem que a filha fez
recentemente, em que é governado por ladrões, em ter que encoxar suspeitos em vielas, em ser o primeiro em tudo
e sempre, caso contrario e inapelavelmente sua mulher vai colocar chifres nele.
É dose. Nem é preciso refletir muito pra saber que isso não vai dar certo.
E foi hoje que encontrei uma entrevista ( leia
aqui ) publicada já vai fazer três anos, feita com estudiosos de assuntos
relativos a periferia de São Paulo e que dão preciosas informações sobre o
crime organizado ou o PCC que é a mesma coisa.
Impressionante como se percebe uma
evolução, uma modernidade, digamos assim,
no crime dito organizado, enquanto o que se vê de parte da Segurança
Publica - ao menos da segurança da qual faz parte aquele sargento - é
uma involução. Enquanto os
integrantes disso que chamamos de quadrilhas já adquiriram um entendimento bastante complexo do que seja paz, justiça, liberdade e igualdade, a nossa
Segurança
Publica ainda engatinha no simples reconhecimento dos direitos cidadãos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário